Túlio Maravilha e a proeza de assinar por dois clubes na mesma semana
28/12/2022 às 9h00
Túlio Maravilha foi um personagem caricato do futebol brasileiro. Entre muitas de suas pérolas, um episódio no mínimo cômico aconteceu no início dos anos 2000. Já em reta final de carreira, o jogador conseguiu a proeza de ser anunciado em dois times na mesma semana.
O caso aconteceu em outubro de 2001, quando o Santa Cruz frustrou uma negociação do rival Sport Club do Recife que envolvia o atacante.
MaraIlha VS MaraSanta
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Tudo aconteceu quando o Campeonato Brasileiro daquele ano já estava na segunda metade e os dois times pernambucanos amargavam as últimas posições da competição. Para sair da zona de rebaixamento, ambos pensaram a mesma coisa: contratar um goleador.
O Sport foi mais rápido e procurou o atacante, na época com 32 anos. Com um histórico de artilharias da Série A, Túlio vinha amargando uma fase ruim com o Vila Nova, então na Série B do Brasileirão.
No dia 29 de setembro de 2001, Túlio assinou um contrato com o Leão da Ilha, que ditava que o jogador receberia R$ 2 mil salariais, com gratificação de R$ 40 mil caso o Sport avançasse para o mata-mata. Em caso de rescisão, uma multa de R$ 100 mil seria bancada pelo incumpridor.
Três dias depois, no dia 2 de outubro, Túlio foi recebido no aeroporto pelos torcedores do Sport (foto acima), vestindo a camisa do time e tirando fotos com os fãs. No estádio do clube, no dia seguinte, o jogador chegou a brincar dizendo que havia mudado de nome:
“Mudou. Antes era Túlio Maravilha, no Botafogo. Depois, fui para o Vila Nova e era Túlio Maravila, agora, aqui no Sport é Túlio Marailha”, disse fazendo alusão ao estádio do Sport, a Ilha do Retiro.
Porém, de volta à Goiânia, Túlio admitiu que havia uma dívida com o Vila Nova que precisava ser acertada para garantir o seu passe.
“Junta tudo, diminui, subtrai, escorrega um, vai outro pra cá, a gente vai chegar num acordo”, brincou.
Quem parece ter pagado a conta foi o Santa Cruz, o maior inimigo do Sport. Cinco dias depois, 7 de outubro, Túlio voltou ao Recife, dessa vez vestindo a camisa do Santa (foto acima).
“O show não pode parar, tem que continuar”, disse Túlio.
Fazendo o mesmo tipo de brincadeira que havia feito dias antes, o jogador “trocou” de nome.
“Marasanta, né? De santinho acho que todos nós temos um pouco”, completou.
Bastidores
De acordo com matéria publicada no Jornal do Comércio, de Pernambuco, em 5 de agosto de 2018, José Valadares (foto acima), presidente do Sport, abriu mão da contratação diante das entrevistas dadas por Túlio Maravilha. Sendo assim, o presidente do Cobra Coral, como Santa Cruz é apelidado, Alexandre Mirinda, começou a negociar o jogador.
“Túlio não estava contratado pelo Sport. Que fique bem claro. Ele veio para Recife para discutir uma possível contratação. Apresentamos a proposta do Santa Cruz, sem fazer leilão e ele se mostrou sensível. Fomos direto na esposa dele, quem decidia tudo na carreira dele e onde iria jogar” afirmou Mirinda em entrevista ao jornal.
Alexandre exigiu que o jogador assinasse na negociação, que durou toda uma madrugada, tudo para evitar reviravolta.
Tudo certo, então?
Não! No meio dessa negociação toda, só faltou avisar o presidente do Vila Nova, Ovídio Araújo, de que ele perderia seu atacante (foto acima).
“Ele fez aquela onda toda, mas ainda tem contrato com o Vila Nova”, ironizou na época”.
“Na hora de jogar, faltava um pagamento do Sport. Deram um cheque sem fundo”, rebateu Túlio à reportagem.
Para o presidente do Sport, que havia colhido a assinatura do jogador, Túlio estava mentindo. Ele ainda acusou o jogador de não ter devolvido o valor de R$ 15 mil pago pelo Sport no dia 29, com recibo assinado pelo próprio Túlio.
Fato é que no dia 5 de outubro o Santa Cruz pagou a primeira das duas parcelas de R$ 25 mil ao Vila Nova. Ao mesmo tempo, o Sport protocolava o pedido de registro de contrato da FPF (Federação Pernambucana de Futebol).
Resumindo e concluindo
De acordo com o vice da FPF na época, José Joaquim, em entrevista ao Jornal do Comércio, o Sport havia entrado com documentação incompleta.
“Ainda falta a rescisão do contrato ou o termo de empréstimo que é emitido pelo clube a quem o jogador pertencia (Vila Nova). Pelo que estou sabendo, nos papéis do Sport não consta nem uma coisa, nem outra”, declarou ao jornal.
Mesmo sem o contrato homologado, o presidente do Sport, Valadares, cobrou de Túlio os R$ 100 mil da rescisão. O ex-jogador, por sua vez, disse que estava acordado para realmente ir para o Sport, mas que faltou um pagamento do clube na negociação.
“Deram um cheque sem fundo e eu retornei para Goiânia”, disse.
De acordo com o atacante, o Santa Cruz ficou sabendo do “furo” do rival e o procurou.
“Eles ficaram sabendo do furo que o Sport deu, foram no Vila Nova e combinaram o acerto. Uma semana depois, eu desembarquei com a camisa do Santa. Estava tudo certo. Tudo zerado. Estreei, cheguei até a marcar um gol. Era o Muricy (Ramalho) o treinador. Houve muitas mudanças e não tivemos uma sequência boa, e o time acabou caindo junto com o Sport.”
Túlio jogou apenas seis partidas pelo Santa Cruz, marcou um gol na estreia contra o Paraná e não evitou que o time descesse de divisão. O Sport, aliás, teve o mesmo destino.
“Faltavam algumas rodadas. O time estava mal no campeonato. Eu me lembro que ficou alguma coisa para trás, algum mês (em valor). Mas a gente entrou num acordo. Tinha alguma coisa para receber e como eu não estava produzindo e queria ir embora, acertamos tudo amigavelmente.”