O Programa Livre marcou a história do SBT e da televisão brasileira ao inserir o jovem como protagonista e tratá-lo de forma séria e inteligente.
Todos os assuntos eram válidos na atração: violência, corrupção, sexo, moda, drogas e política, foram alguns dos temas abordados durante seus mais de dez anos de existência.
Porém, uma das pautas levantadas acabou não dando muito certo. O apresentador Serginho Groisman levou ao palco as principais torcidas organizadas de dois times paulistas e o tempo fechou.
Futebol e violência
Nos anos 1990, era comum ligar a TV para ver um jogo de futebol e se deparar com brigas entre as torcidas organizadas. Sempre que rolava um clássico, a pancadaria dominava as arquibancadas.
Muitos debates e conversas ocorriam sobre o fim das torcidas nos estádios. Apontados como os principais responsáveis pela violência, eles queriam espaço para mostrar que não era algo generalizado e que o motivo maior era a torcida.
Em maio de 1992, Serginho teve a ideia de unir os líderes das torcidas do Corinthians e São Paulo para debater como acabar com a desarmonia predominante e, principalmente, como limpar a imagem desses grupos perante a sociedade e as autoridades.
Pancadaria no estúdio
Para garantir o bom andamento da atração, essa reportagem não seria exibida ao vivo, mas sim gravada antes. O auditório, que era em formato de arena, estava lotado, com mais de 250 pessoas. Quando as gravações começaram, iniciaram também os desentendimentos entre os componentes das torcidas, que inclusive partiram para as vias de fato.
“Tive a brilhante ideia de reunir as torcidas [Gaviões da Fiel, do Corinthians, e Independente, do São Paulo]. Foi grave, quebrou o maior pau. Fiz uma bobagem porque estava iludido. Eles tinham me dado todas as garantias e acreditei”, disse o apresentador para a Playboy, em setembro de 1998.
Dor de cabeça
O programa foi suspenso e muitas pessoas foram parar no hospital. A maioria dos jovens que faziam parte do auditório era de estudantes.
“Foi gente para o hospital. Tinha 100 pessoas brigando naquele estúdio. Os seguranças do SBT salvaram algumas pessoas. No outro dia, vieram os pais de dois meninos das torcidas que tinham ido parar no hospital. Tive que ouvir os pais chorando. Depois tive que ir explicar nas escolas”, relatou.
A violência continuou nos estádios e atingiu o ápice em 1995, durante a final da Copa Juniores entre São Paulo e Palmeiras: o Pacaembu virou uma praça de guerra e um torcedor morreu. Tudo foi transmitido ao vivo, sem cortes.
Em 2016, o Ministério Público de São Paulo determinou que todos os jogos clássicos tivessem apenas a torcida mandante. Muitos criticam essa lei, afirmando que ela não é eficaz para conter brigas.
As vozes do Carandiru
No mesmo ano em que Serginho resolveu juntar as duas torcidas, ele fez um Programa Livre histórico: ao vivo, direto do Carandiru, entrevistou presos que soltaram a voz ao falar sobre o sistema prisional e a vida na penitenciária.
“Fiz um programa ao vivo direto do Carandiru com 3 mil detentos. Nós dividimos o programa em três partes. Na primeira, eu conversei com eles a respeito da vida que eles levavam, não procurei identificar em cada um o que fez, o que não fez, mas tentei manter um coletivo que pudesse se expressar para a gente e poder entender melhor o que é a população carcerária”, declarou no Roda Viva, em setembro de 2020.
“Na segunda parte, eles elegeram a Sula Miranda, e a gente levou para cantar. Na terceira parte, entrevistaram o diretor do Carandiru”, continuou.
Meses depois dessa entrevista, em 2 de outubro de 1992, ocorreu o massacre do Carandiru, no qual 111 detentos foram mortos.