Entre todas as histórias da maior tragédia do futebol brasileiro, a do narrador Ivan Carlos Agnoletto beira o sobrenatural e conta com uma dose de sorte. O locutor estava de malas prontas para embarcar no avião que carregava a delação da Chapecoense para a final da Copa Sul-Americana em 2016.
Ivan Agnoletto (Reprodução / Web)Agnoletto também era coordenador da rádio Super Condá e estava escalado para transmitir a final entre Atlético Nacional e Chapecoense, contudo, de última hora, em um ato de solidariedade, o narrador cedeu a vaga para sua colega Gelson Galiotto, que sonhava em cobrir uma final internacional.
A decisão foi tão em cima da hora que não deu tempo de tirar o nome do coordenador da lista de passageiros. Por conta disso, na madrugada do dia 29 de novembro, o celular de Agnoletto não parou de tocar.
Sua mulher atendeu as ligações recebendo os pêsames dos amigos e familiares por perder o marido, quando, na verdade, ele estava dormindo ao seu lado.
Escapou por pouco
Em entrevista ao Esporte em Discussão, em dezembro de 2016, o principal narrador da rádio Super Condá relembrou como foi descobrir o acidente.
“Eles não tiraram o meu nome da lista. Por isso, eu só fui acordar na madrugada de terça-feira, quando a minha mulher, colada à cama, recebia os pêsames pelo meu passamento. Foi neste momento que eu soube que o avião havia caído”, revelou o locutor.
Além de Gelson Galiotto, outro amigo estava no voo LaMia 2933. Trata-se do repórter e setorista da Chape, Edson Luiz, conhecido como Picolé.
Para o G1, no dia 29 de novembro de 2016, Agnoletto lembrou da empolgação do colega ao saber que poderia realizar seu sonho.
“Eu estava escalado para o jogo, mas meu colega tinha esse desejo de fazer uma final internacional. Quando falei para o Gelson Galiotto que ele ia, nem acreditou: ‘Sério? Eu vou mesmo?’ Era o sonho dele”, recordou Ivan.
Suportou a pressão do filho
Chapecó estava em êxtase com a primeira final internacional do clube da cidade. Jogadores, torcedores, cartolas e a imprensa estavam unidos pela Chape.
O filho de Ivan, Igor Agnoletto, dentista, era um dos mais empolgados com o clima e perturbou seu pai para viajar à Colômbia para narrar o primeiro troféu continental da Chapecoense.
Para a BBC Brasil, ele revelou que até grupo no WhatsApp fez para pressionar o pai, que chegou a ser motivo de discussão na família.
“Virou motivo de discussão porque as coisas são muito difíceis para a gente, estávamos felizes com o sucesso da Chapecoense. Hoje, estamos muito tristes, mas aliviados”, contou na época.
“Acho que predominou o alívio de ouvir a voz dele (pai) no rádio fazendo boletim hoje de manhã. Agora, eu fico imaginando o que eu sentiria se ele embarcasse. Eu me arrependeria muito, para sempre”, declarou Igor.
Mais de mil partidas
Atualmente com 63 anos, Ivan Carlos Agnoletto pode celebrar os 50 anos da Chapecoense, clube pelo qual escolheu torcer na infância e acompanha até hoje, como narrador.
De acordo com o locutor, são 1.257 narrações em jogos oficiais nas rádios Chapecó e Condá. Ivan é colunista do Diário de Iguaçu desde a fundação do jornal, em 1977.
Ao site Di Regional dia 10 de maio de 2023, o jornalista falou sobre sua relação com a Chapecoense.
“No final da década de 1960, meu pai me acordava para ouvir os jogos do Inter. Aos poucos, fui me interessando por futebol, graças à empolgação do meu pai com o Colorado (…) A partir daí, por ter (um) futebol amador forte, Chapecó começou a se mobilizar para fundar um time. Veio nossa Associação Chapecoense de Futebol. Jamais esqueço! Meu pai me levou para campo do Colégio São Francisco ver o primeiro amistoso. De lá pra cá, o que brotou no coração só cresceu”, contou Agnoletto.