Afonsinho, o primeiro jogador realmente livre do futebol brasileiro

Afonsinho, jogador do Santos

A luta pela liberdade existe deste sempre. Sejam monarquias que foram derrubadas pelas revoluções ou países que conquistaram a independência de seus colonizadores. Nas modalidades esportivas, em especial o futebol, não é diferente. Afonsinho que o diga.

Apesar do futebol ser o esporte e entretenimento mais conhecido, amado e difundido no mundo, o que era para ser diversão já foi (e por vezes, ainda é) a opressão de muitos.  Quem nunca ouviu uma história ou assistiu a um filme que contasse as agruras de jogadores de futebol?

Um grande exemplo, e talvez o maior ícone da luta pela liberdade dos jogadores para escolher onde jogar, qual camisa defender ou como conduzir suas carreiras, é Afonso Celso Garcia Reis (75).

Doutor do futebol

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Paulista de Marília (SP), Afonsinho era, além de jogador (um dos poucos que defendeu os quatro grandes clubes cariocas), médico. Aliás, cursar medicina foi uma das exigências de seu pai para que ele jogasse no Botafogo. Formou-se pela UERJ e, por 30 anos, trabalhou no Instituto Pinel, onde se usou do futebol para tratar os pacientes do hospital psiquiátrico.

Até hoje, aposentado do futebol (abandonou as chuteiras aos 34 anos), ele trabalha com saúde da família, no Rio de Janeiro. Além disso, organizou uma escolinha de futebol para crianças carentes e, desde 1975, junto com grandes amigos, fundou o time Trem da Alegria. No time amador, já passaram craques da bola e da música, como Garrincha, Nilton Santos, Paulinho da Vila, Fagner, Moraes Moreira. Atualmente, tem uma coluna na Revista Carta Capital.

Libertação

Em meados da década de 70, Afonsinho defendia o Botafogo (foto acima) e já havia ganhado notoriedade no meio futebolístico Era um dos jogadores mais bem pagos da época e havia conquistado diversos títulos para o clube. Divergências com a diretoria botafoguense o levou, por empréstimo, ao Olaria.

Quando voltou ao alvinegro, ficou oito meses com o contrato suspenso, em virtude dos cabelos compridos e da barba crescida, que Afonsinho ostentava, com orgulho, desde a faculdade e militância política.

Cansado da repressão, o jogador pediu demissão e a liberação de seu passe para seguir sua carreira. Começava aí, sua história de luta e conquistas, mesmo durante a ditadura militar.

Inconformado com a apreensão de seu passe pelo Botafogo, Afonsinho, apoiado por seu pai e amparado por advogados, recorreu ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva pela liberação de seu passe.

“Por trás de tudo isso havia a tentativa de se impor uma medida de força também no esporte. A partir daí, juntamente com o meu pai, um ex-ferroviário que se formara em Direito, partimos para garantir o meu direito de trabalhar. Posteriormente, com a ajuda de outro advogado, Rui Piva, e o Rafael de Almeida Magalhães, conseguimos o passe livre no Superior Tribunal de Justiça Desportiva, mas só depois de muita luta”, orgulha-se o jogador.

Vitória

Em 1971, Afonsinho foi o primeiro jogador brasileiro a ter o passe livre, por uma decisão da justiça. Apenas vinte e sete anos depois desta conquista, instituiu-se a Lei Pelé ou Lei do Passe Livre, em março de 1988, a qual, em suma, concede o direito de negociação do passe pelo jogador e/ou seu agente e não mais pelo clube a qual pertence.  O jogador deixou de ser “propriedade” dos clubes.

A conquista foi tão notória que até o Rei Pelé reverenciou Afonsinho em uma entrevista.

“Homem livre no futebol, só conheço um, Afonsinho. Este pode dizer com suas palavras, sem medo, que deu o grito de independência ou morte. Ninguém mais! O resto é conversa!”, disse Pelé, durante um desabafo após renegociar seu contrato com o Santos, em 1972.

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